A Arte da Solitude

Não desejo viver em uma casa de campo. Deixo isso para Elis Regina.

Minha natureza é muito urbana para tal. Aprecio poder participar de eventos culturais sempre que desejo, e residir em uma metrópole me proporciona essa possibilidade.

Observar rostos diversos, explorar locais desconhecidos, relaxar em um café e permitir que a imaginação flua, assim como o balão da menina de Banksy.

Exceto pela falta de cabras e ovelhas no jardim, posso ver meu apartamento como a minha casa de campo.  É o meu lugar de descanso, meu pequeno paraíso com o aroma dos campos floridos.

Onde cultivo meus amigos queridos, regando-os com conversas agradáveis na cozinha acompanhadas de um ótimo pinot noir.

Além disso, cultivo a minha coleção de discos, de cepas de excelente qualidade… esses vinis que tornam as noites do meu espaço acolhedor ainda mais especiais, enquanto aproveito a leitura de um bom livro.

Neste momento não me importo em plantar meus livros, uma vez que frequentemente minha mente viaja, tornando o livro apenas uma extensão do meu braço.

Mas eu tenho uma plantação de livro também. Cultivados com a dedicação que apenas uma jardineira devotada poderia oferecer.

Neste poema idílico, certamente o celular está desligado. Com todas as minhas colheitas à disposição, por que buscar nas redes sociais o quintal dos outros?

Meu jardim é repleto de tonalidades, melodias e fragrâncias. Isso é suficiente para mim. E não se trata de solidão, mas de um estado de solitude.

síndrome de BURNOUT (I) – não era apenas cansaço

Depois de mais de duas semanas sem ler nada, hoje acordei com o firme propósito de ler algumas linhas. Peguei o livro que comprei na FLIP, desembalei e toda senhora de mim comecei a ler. No meio da primeira página eu já não conseguia entender as palavras.

Fechei o livro e fui arrumar algumas coisas em casa. Logo após o almoço, liguei o computador para tentar escrever algo, mas não consegui escrever uma linha sequer.

No início de outubro fui diagnosticada com Burnout, e muito tolamente pensei que alguns dias de descanso seriam suficientes.

Viajei para um paraíso litorâneo e pensei que uns dias de pernas para o alto,  escutando o barulho das ondas fosse resolver meu problema. Mas não resolveu…

Que sensação desesperadora! Porque na realidade Burnout não é cansaço, não é stress, não é sobrecarga de trabalho.

É uma doença que incapacita, imobiliza e movimenta em nós o sentimento de que não estamos nos esforçando o suficiente. E isso vira um círculo vicioso, pois não estamos produzindo, logo o trabalho vai atrasar, e a angústia chega a tal ponto que a mente, cansada de dar pistas que já chegou a um limite, começa a atacar o corpo de uma forma mais contundente.

No meu caso, em setembro eu fui duas vezes para o pronto-socorro. Na primeira vez fui com febre altíssima, mal conseguia andar, e o diagnóstico foi pneumonia, sem que eu tivesse qualquer sintoma anterior, sequer um resfriado, revelando uma imunidade muito baixa.

Da segunda vez, estava com todos os sintomas semelhantes a um AVC. Graças a Deus não era.

Mas era o corpo gritando para eu parar, para eu meter o pé no freio imediatamente, e eu não o escutei pois estava preocupada demais em produzir mais alguns tópicos da minha tese de doutorado junto com a disciplina que tenho que ministrar na UFRJ, junto com o artigo que estou escrevendo, junto com uma consultoria, junto com a organização da casa, junto com as contas do mês, junto com as compras de supermercado, junto com a reforma do terraço, junto com … Junto com… E não deu mais.

Comecei uma via crucis com vários médicos e exames, até que hoje eu pensei que estava tudo bem, pois já tem quase um mês do início do diagnóstico e tratamento.

Mas não está tudo bem. Tive a certeza absoluta disso. Agora, ao digitar estas linhas ainda meio confusas, eu sei que o caminho vai ser longo.

Se identificou com o que descrevi acima? Está sempre cansado e achando que não está dando conta? Pára e escuta sua mente e seu corpo. Não deixe chegar onde eu cheguei.

PARE DE ROMANTIZAR DIZENDO QUE VOCÊ É FORTE, SÓ ESTÁ CANSADA(O).

Não permita que esse mundo louco e distópico em que estamos vivendo tire o que você tem de melhor, que é o poder estar bem em um mar de cobranças e incertezas.